julho 30, 2009

Perspectivar

Um colega de faculdade, amigo, morreu há dias. Um ano mais novo que eu. Católico de devoção fervorosa. Tinha comprado casa há uns meses, depois de anos solteiro e bom rapaz (e nem por isso por escolha) estava feliz ao lado da sua namorada.
Não lhe tinha grande amizade no início. Aliás, quando ele entrou na faculdade não podia com ele. Era irritante, aqueles alunos meio graxistas, sempre a fazer perguntas que poucas vezes eram pertinentes.
Mas mudei radicalmente a minha opinião nos últimos 2-3 anos, em que foi meu colega de trato mais próximo. Percebi que ele, nas suas convicções fortes (e que abrangiam toda a sua vida, como é comum para os católicos) tão díspares das minhas, era uma pessoa querida, preocupada, atenciosa e que respeitava a minha ausência/afastamento de convicções religiosas. Isto para o comum dos católicos fervorosos é uma tarefa hercúlea, e reconheci-lha.

Estava em Barcelona quando falei com ele pela última vez. Convidava-me para ir a casa dele, conhecer a casa nova e celebrar os anos dele. Respondi-lhe que teria imenso gosto mas que infelizmente estava em Barcelona nessa altura... mas que haveria certamente outra oportunidade.
Arrepia-me pensar que não estou com esta conversa porque sim e porque fica bem e porque é giro ter o que escrever, mas porque foi textualmente assim. A minha certeza. E certamente a dele também... talvez o Deus que ele sempre amou não tenha achado piada às nossas certezas sobre algo que não está no nosso domínio.
Acredito que ele e a família acreditam que Deus o quis junto dele. Espero que encontrem conforto, paz e serenidade nessa crença, espero sinceramente.
Eu pessoalmente, não conseguiria sentir nada se não raiva, sentimento de injustiça perante tamanha ironia e provocação... do destino, de Deus, das circunstâncias. Seja o que for, é incompreensível que um jovem, a iniciar a construção da sua vida de adulto, aparentemente saudável, simplesmente morra.

6 comentários:

Only Words disse...

Ao ler as tuas palavras, confesso que identifiquei algo parecido, já passado comigo. Não sou uma católica fervorosa, mas as minhas experiências de vida têm-me feito acreditar que esta vida, a nossa vida, é apenas uma passagem. Ver partir alguém que supostamente teria ainda muito para viver e dar, já me levou a questionar este meu Deus, aquele que sinto e acredito. Mas com o passar dos dias, das semanas, dos meses e dos anos, começo a aceitar melhor a "partida", alimentando a certeza que quem partiu está algures num lugar bem melhor que o meu, que o nosso, que o de todos que por cá andam...ainda!

Alex disse...

Embora seja tua leitora há já algum tempo vou comentar pela primeira vez. Porque também tive o prazer de o conhecer, embora tenha sido apenas sua colega de enfermaria durante algum tempo. Porque ele me marcou e porque a morte dele me causou uma dor incrível. E porque neste post falaste em algumas das coisas que me faziam admirá-lo. Espero que continues a escrever e eu te posso ir acompanhando nos teus "delírios esquizofrénicos".

esquizoide disse...

Ele era muito acarinhado por quem o conheceu. Por isso mesmo, por não ser uma coisa que se diz porque todos são santos quando se finam... simplesmente porque ele era realmente uma pessoa querida, bem formada e preocupada com os que lhe cruzavam o caminho.
Há uma certa injustiça de o ceifar de um quase berço, logo alguém que era tão devoto... se tentarmos acreditar (e no fundo a medo acredito), não há como não ficarmos irados.
Não percebo como se pode, sendo crente, aceitar estas coisas...

Sara M. disse...

não tenho muitas palavras nestas situações mas tb nao podia deixar de escrever alguma coisa. realmente a vida (ou a morte) está muito fora do nosso controlo. é tão efémera que dói.

também não sou crente e talvez isso me deixe mais revoltada quando vejo pessoas morrerem tão jovens, com tantos sonhos por realizar.

mas.. como todos dizem, a morte é o que temos mais certo. pode ser daqui a 60 anos mas também pode ser já amanhã (ou hoje).

*

RM disse...

Entendo-te perfeitamente... Este ano, um grande amigo meu siucidou-se. Inesperadamente, mas contudo algo que seria esperado mais tarde ou mais cedo. Sabes o que mais me marcou?! É que depois da partida dele, a minha terra de coração, PC, nunca mais será a mesma. E é incrível como ele nos faz falta e como todos (os amigos) sentimos que uma época chegou literalmete ao fim... São esstas coisas que nos fazem pensar na nossa própria vida e em como tudo é efemero... Para o teu amigo, desejo uma partida algo descansada, se é que podemos pensar que a mudança, deste mundo para algures será eterna e mistica... De todo o meu coração, muta força neste momento menos bom...

a ervilha disse...

obrigada, um beijinho da mana marta